Artigo 038
O mês de outubro nos traz a memória da origem da Igreja que nasceu em saída e com o pontificado do Papa Francisco os contextos para sair se tornaram muito mais visíveis. Na atualidade, a Igreja no Brasil vive um momento de graça, pois a missão dela é vivida intensamente nas situações missionárias internas abrindo as portas aos contextos externos, para a dimensão universal da missão. A missão é um chamado a responder a muitos desafios, entre os quais o maior é a globalização excludente. A missão é um caminho no despojamento e na pobreza, é itinerância e busca, é proclamação de esperança e denúncia de toda injustiça, é escuta e testemunho e, enfim, é uma radical entrega da própria vida ao projeto de Deus. A missão universal abrange todos, sem excluir ninguém, a partir da diversidade das culturas e dos povos.
A universalidade da missão apresentada na expressão ad gentes, em primeiro lugar indica o mandato explícito de Jesus de anunciar a Boa-Nova a toda humanidade, e a vontade de Deus de salvar todos os seres humanos. A compreensão do anúncio possui duas vertentes, sendo que a primeira tem por alvo o povo eleito, aqueles que aderiram à fé na pessoa de Jesus, os cristãos. A segunda vertente direciona-se aos povos que ainda não conhecem Jesus. Essa vertente ficou marcada por um trágico senso de superioridade, a negação do outro e a sangrenta expansão colonial. Mas, como observa Raschietti,(2012) a missão aos povos na mudança de época exige, como preconiza o concílio Vat. II, a instauração de “uma ordem de relações humanas” que, por sua vez, convoca a Igreja para um “novo Pentecostes” e “um salto adiante” capaz de recriar uma nova e ‘simpática relação com a humanidade, a fim de colocá-la em contato com as energias vivificadoras e perenes do Evangelho, sobretudo através do compromisso com a justiça, a paz e a unidade dos cristãos e da família humana universal.
A missão sempre é compreendida como a de uma comunidade eclesial em defesa do bem-estar da vida de todos os povos. A inspiração para essa missão vem do próprio Deus, envolvendo não somente sua imagem abstrata, mas a de Deus Emanuel, que se encarnou e viveu como nós. A missão é histórica, pois ela possui a herança do passado, a experiência do presente e a visão do futuro. É nesse sentido que se compreende a natureza missionária da Igreja e ela mesma se firma como Igreja de Deus quando coloca como centro de suas preocupações não a si mesma, mas o Reino que ela anuncia como libertação de todos, para que vivam em plena comunhão entre si e com Deus (DGAE/1995, n 64).
No interior da “natureza missionária” a Igreja não vive para si, pois ela tem a tarefa de “convocar e enviar servos e testemunhas do Reino”. Para isso, a Igreja envia seus servos, que são santos e pecadores, para articular, universalmente, os povos numa grande rede de solidariedade. Desse envio nascem comunidades pascais que tentam contextualizar a utopia do primeiro dia da nova criação. A partir dessas comunidades, como mostra Paulo Suess (2007) nasce o envio, a missão, com seus dois movimentos, a diástole, como envio à periferia do mundo, e a sístole, que convoca, a partir dessa periferia, para a libertação do centro, o coração da Igreja. Sob a senha do Reino, ela propõe um mundo sem periferia e sem centro.
A vida religiosa consagrada, que se encontra no interior dessa comunidade, é convocada a se abrir e dar uma nova dimensão a essa missão. Os religiosos/as acolhem esse apelo da Igreja a partir da experiência com o Jesus encarnado e ressuscitado, e chama seus membros para sair de si e chegar às culturas, povos e religiões diferentes, e permanecendo como hóspede na casa do outro realizar a missão. Mas ficar como hóspede não é uma tarefa fácil. Max Warren nos coloca em alerta que “Ao nos aproximarmos de outro povo, outra cultura e outra religião, nosso primeiro dever é tirar os sapatos – pois o lugar do qual nós estamos aproximando é sagrado. Caso contrário podemos nos descobrir pisando no sonho de outra pessoa. Mais sério ainda: podemos esquecer que Deus lá estava antes que chegássemos”. Assim, ao chegar no fim de mês de outubro tenhamos como religiosos a clareza de trilhar nos passos de missão da “Igreja em saída”.
Joachim Andrade SVD